quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Um mês com o salário mínimo.


Reportagem: Crónicas de um jornalista em apuros.

Com o novo ano, o salário mínimo subiu para os 450 euros. O repórter do Expresso Hugo Franco vai contar diariamente como é viver com este dinheiro. Não é comum o jornalista tornar-se notícia. Mas abrimos uma excepção...

Viver com 450 euros
O ano novo começou com uma boa nova. O salário mínimo subiu para os 450 euros. Mas será mesmo uma 'boa nova'?

Esta semana, em vez de relatar as minhas desventuras com o salário mínimo, conto os casos mais duros e reais que recebo todos os dias no meu e-mail.

A família de Andreia sobreviveu durante anos com o salário mínimo da sua mãe. O seu pai (professor) tinha ficado no desemprego. Viviam numa casa alugada. A renda e os custos fixos da habitação perfaziam quase todo o dinheiro que tinham disponível por mês. "Só compravamos marcas brancas e só podíamos gastar à volta de 10€ por semana no supermercado. Absolutamente nunca fomos comer fora."

Durante esses anos negros, em casa de Andreia não se comeu queijo e fiambre, e o pão só levava manteiga. "Só bebíamos água. Comprar um pacote de sumo seria um luxo". As refeições eram "obviamente" muito simples. "O facto de se comprar bacalhau no Natal era uma despesa tão grande que tirava parte da alegria da quadra".

Andreia recorda que na escola foi obrigada a estudar sempre com livros cedidos por pessoas de outros anos. Ela não podia ir às visitas de estudo porque era uma despesa extra muito elevada, e até as sapatilhas da ginástica eram emprestadas. "Felizmente na escola deram-nos o subsídio escolar que dava direito a refeições e ao passe social."

Os seus pais, por exemplo, tinham de percorrer grandes distâncias a pé para poupar o dinheiro do passe.

À hora de almoço na cantina, Andreia guardava sempre o pão e o iogurte para comer ao lanche.

Durante esses anos ninguém da sua família comprou roupa nova, ou foi ao cinema. Também não podiam ir de férias. "Só andei de táxi uma vez quando estava muito doente e tive de ir às urgências. Não se podia sequer sonhar em comprar um carro... aliás, o orçamento não permitia sequer comprar um chocolate na rua se nos apetecesse! Nessa altura viajar em transportes públicos já era um luxo."

Andreia não tem dúvidas: para uma família sobreviver com um salário mínimo não chega ser cauteloso nos gastos: "É necessário abdicar de quase tudo o que as pessoas consideram essencial, como ir ao dentista, comprar um lanche na rua quando não se almoçou, um medicamento receitado por um médico".

"Felizmente sempre conseguimos viver com dignidade e sem contrair dívidas, e as coisas acabaram por melhorar e assim continuam. Mas foi sem dúvida uma experiência que marcou o meu crescimento e me tornou uma pessoa muito mais alerta e sensível em relação às injustiças sociais, e ao esforço sobrehumano que certas mães e pais fazem para sustentar uma família à base de quase nada".

Sem comentários: